18 novembro 2011

Teoria da Fonte

Mês passado eu estava voltando com músicos e equipe após um show. Estávamos numa van e lá havia um convidado de um dos músicos, que conseguiu uma carona conosco. Em um dado momento, o referido começou a disparar piadas, a primeira, que durou o tempo que uma van leva de Anchieta até depois de Coelho Neto pela Av. Brasil, foi um absoluto fracasso. Eu já conhecia, mas quem não conhecia não entendeu. Ele fez outra dizendo "agora vocês vão rir" e foi outro fracasso retumbante. Mais uma tentativa e nova falha, a situação já estava constrangedora. Eis que um dos músicos conta uma piada e todos caem na gargalhada. Era uma piadinha boba, digna de hora do recreio no Colégio Imaculado Coração de Maria, o que só gerou revolta do primeiro contador de piadas da viagem. Depois daquilo, ele acreditou piamente que só não ríamos de pirraça, que eram do mesmo nível e coisa e tal.

Só que a questão envolve um pouco mais do que pirraça. Eu não sou cientista (e mesmo que fosse acho que seria impossível atribuir um número cientificamente ao que vou falar agora), mas acredito que mais de 50% da graça da piada está exatamente na maneira e em quem se conta. Esse mesmo músico da piada de sucesso: Ele já contou um determinado caso de bastidores da MPB umas 4 vezes na volta de shows. E nas 4 vezes todos morreram de rir. A história em si, não fiquem curiosos, não tem nada de escandalosa, só uma noite de bebedeira, mas a maneira de se construir diálogos e situações compõem o ambiente hilário.

A partir desse dia da piada ruim na van, eu pensei bem a respeito e comecei a criar o que eu chamo de "Teoria da Fonte". Ela não serve só para o humor, mas para vários aspectos das relações sociais. Eis a Teoria:

"A sua opinião e reação a um determinado fato é impossível de ser desassociado aos seus sentimentos e opiniões sobre o agente/autor e influi muito mais do que nossa consciência deixa perceber".

Complicou? Exemplificamos: Uma pessoa é traída pelo namorado. A partir de agora, esse namorado é um cretino, um canalha, não tem coração e nada justifica a traição. Se ele estava infeliz, que largasse primeiro, oras!. Ao mesmo tempo, uma amiga dessa primeira pessoa trai o namorado. E essa amiga é tudo na vida dessa pessoa. Agora, ela vai e diz à amiga - inconsolável porque o namorado descobriu a traição e não pensou duas vezes em terminar tudo - que essas coisas acontecem, que ela teve um momento de fraqueza, e que o namorado traído não só deu motivos para ser traído como também por mais grave que achasse aquilo, não deveria largar a pessoa assim de qualquer maneira.

Bipolaridade? Dois pesos e duas medidas? Não, só a Teoria da Fonte. Se você for questionar a diferença de comportamento para duas situações iguais, a pessoa irá dizer que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Pra nós, que vemos de fora toda a situação, são duas traições iguais. Para a menina em observação, temos de um lado um cara que vacilou com ela e uma amiga que é tudo na vida dela e que não a causou mal algum.

É um mal? Sim. Acabará com o mundo? Não. O mundo sempre existiu assim. A Teoria da Fonte explica basicamente todas as relações humanas, principalmente das pessoas mais dramáticas e que gostam de transparecer aos outros o que estão sentindo, porque é assim que as coisas ficam mais evidentes. Eu não sou nenhum mestre zen como alguns amigos dizem, mas gosto muito de uma menina que me ajudou num momento difícil da vida, e eles a odeiam e vivem falando mal dela, e me perguntando como eu a aguento. Eu os entendo, eles não tiveram com ela uma reação tão próxima como eu tive, e por isso a criticam até em coisas que fazem igual. Ao memso tempo, odiava uma pessoa desde 2005 e ficava vendo nas fotos dela do orkut traços de loucura. Aí fiz as pazes com ela no começo do ano e comecei a perceber a beleza de seu sorriso e de seus olhos, que eram rigorosamente os mesmos, mas pareciam ocultos para mim.

Mas e aí, tem tratamento? Tratamento não tem porque não é uma doença, mas existe um exercício que vai fazer você se surpreender do quanto de Teoria da Fonte existe dentro de você e você nunca percebeu:

Pegue uma pessoa que você esteja odiando no momento, pode ser o caixa do supermercado que errou o troco, o segurança de boate que não te tratou devidamente ou o seu irmão que acabou de aprontar alguma com você. Beleza. Agora SEJA essa pessoa. tente se colocar no lugar dela, o que está em jogo aqui é um exercício de empatia que você precisa se ver com olhos que não são os seus, uma visão de fora. Se fosse outra pessoa que fizesse o que você fez, você aguentaria? Nessa brincadeira, uma regra é de suma importância. Você tem que se jogar no lugar da pessoa até descobrir o que a motivou a agir assim. E não vale enquanto suas respostas forem "por maldade" ou "de sacanagem". Não, não existe uma KGB só para te perseguir, eu te juro, você nem é tão importante assim para o mundo. SEJA a pessoa e tente achar os motivos da pessoa. Garanto que você vai se surpreender ao se olhar sem as amarras da proteção.

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